Métodos e poder de Eduardo Cunha já incomodam o PMDB e o Planalto
Fonte: O Globo - Gerson Camarotti e Maria Lima
Deputado começou com Collor, depois Garotinho, e hoje controla cargos federais.
Emergente e ostensivo, o poder do deputado federal Eduardo Cunha (PMDB) no Congresso começa a rachar.
E é em sua base a fissura: com o aval do Palácio do Planalto, deputados mais antigos da bancada e até ministros do PMDB decidiram cercear a atuação de Cunha e limitar seu raio de influência, ampliado no segundo mandato de deputado federal, quando adquiriu fama de controlar uma bancada de 20 deputados, não só do Rio nem só do PMDB.
Nem o presidente da Câmara e presidente licenciado do PMDB, Michel Temer (SP), esconde o incômodo com a atuação do deputado. O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, teve uma longa conversa com Temer para alertá-lo da situação.
— Alguém precisa dar um freio nesse deputado. Ele está causando muito desconforto com os seus métodos. Vou para o enfrentamento. O Eduardo Cunha está passando dos limites — advertiu o ministro Geddel.
Os métodos de Cunha incomodam. E não foi diferente com os peemedebistas: a iniciativa de coletar assinaturas para tentar instalar a CPI dos Fundos de Pensão incomodou aliados e foi classificada pelo Planalto de chantagem, depois do veto à mudança no comando da Fundação Real Grandeza, fundo de pensão de Furnas. Geddel não foi o único.
Numa reunião na Câmara, deputados influentes como Ibsen Pinheiro (RS), Mendes Ribeiro (RS), Rose de Freitas (ES), Eliseu Padilha (RS) e Colbert Martins (BA) concluíram que Cunha contribui para disseminar uma imagem negativa do PMDB.
A peemedebista Rita Camata (ES) é dura com Cunha:
— Fico incomodada ao ver pessoas que chegaram recentemente e ganharam todo esse espaço. Pessoas como o Eduardo Cunha, que não acrescentam nada à história do PMDB. De onde vem tanta força? As funções mais nobres da bancada são ocupadas por esse grupo. O que o Eduardo Cunha tem de melhor do que eu, que estou no quinto mandato? Ou é competência demais ou ele agrega outros valores que não tenho — diz ela.
O poder de Cunha se expandiu rapidamente pelo Congresso. Em apenas seis anos, o deputado se tornou um dos fiadores da relação entre PT e PMDB. Sua área de influência vai além do comando de decisivas comissões, como a de Constituição e Justiça, que presidiu no ano passado, e a de Minas e Energia, cujo presidente, Bernardo Ariston, é da sua cota.
A indicação do ex-prefeito Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas, em 2007, não é sua única influência na estatal, segundo funcionários: gerentes e superintendentes também teriam sido indicados por ele.
Lula guarda na memória o episódio da indicação de Conde para presidir Furnas, em 2007: como relator da CPMF, Cunha propôs que a arrecadação do imposto fosse dividida com estados e municípios, o que geraria enorme perda ao governo federal.
Ele só mudou o parecer após a nomeação de Conde. Economista, Cunha foi alçado à política no governo Collor. Trabalhou na campanha e se tornou presidente da extinta Telerj, de 1991 a 1993. Foi aliado de primeira hora do ex-governador Anthony Garotinho. Ocupou o comando da Companhia Estadual de Habitação e controlava áreas fortes do governo, como a Cedae, cujo fundo de pensão, a Prece, foi alvo de prejuízos de R$ 300 milhões, segundo a CPI dos Correios.
Evangélico, frequentador da Igreja Sara Nossa Terra, Cunha tem posições radicais em assuntos como o aborto: foi signatário da proposta que torna a interrupção voluntária da gravidez crime hediondo.
Atua como articulador, mais do que como orador: nos 25 discursos disponíveis para consulta no site da Câmara, questões regimentais são prioritárias:
“Sou um escravo do regimento”, diz ele num discurso. Com o seu grupo, Cunha sustenta fôlego para barganhar espaço no governo e no PMDB. Com esse poder, ajudou a reeleger Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) como líder da bancada.
Peemedebistas dizem que Alves é refém de Cunha. Alves pôs Cunha, e um de seus aliados, o agora deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), no comando da Comissão de Constituição e Justiça.
São os próprios deputados da bancada do Cunha que alardeiam os seus poderes. Semana passada, Rose de Freitas (PMDBES) foi questionada pelo colega Nelson Bornier (PMDB-RJ), após subir à tribuna para explicitar que não pertence à bancada de Cunha.
Após o discurso, ela foi abordada por Bornier:
— O que é isso, Rose? É bom ser do grupo do Eduardo Cunha, dá proteção.
— Não preciso de proteção de ninguém. Estou no quinto mandato. Nunca fui tutelada por ninguém — disse Rose, segundo relatos de peemedebistas.
Cunha é visto com frequência no gabinete de Temer, que reconhece nele “um deputado trabalhador”. Mas, a interlocutores, já disse que ele “não tem limites quando quer uma coisa, que está criando constrangimentos para o PMDB”.
Em reunião com a cúpula do PMDB do Senado, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, reclamou do assédio do grupo de Cunha para mudar o comando do fundo de pensão da Embrapa, o Ceres — O ministro relatou na reunião que tinha essa incompatibilidade com o PMDB do Rio. Que tinha problemas com o deputado Eduardo Cunha, que queria mudar o comando do fundo da Embrapa, e ele não cedeu — revelou o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN).
Já Henrique Alves defende Cunha:
— Quem disse que é proibido fazer indicações técnicas para esses órgãos? Os cargos nos órgãos do ministério não são propriedade do ministro! Isso é atribuição do PMDB. — queixou-se:
— Estou no décimo mandato, não sou refém de ninguém. A influência de Eduardo Cunha resulta do seu trabalho e sua capacidade. Ele não fez chantagem com o governo.
“Não tenho voto de cabresto”
Procurado pelo GLOBO semana passada, Cunha negou os alegados poderes e disse que as decisões são tomadas pelo conjunto da bancada do Rio, tendo ele como porta-voz. Ele afirmou que a ocupação de cargos por integrantes do grupo é natural, já que eles formam a maior bancada estadual.
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